Após anos de desgaste com sequências repetitivas e pouco criativas, a franquia Jogos Mortais ganha um novo fôlego com Espiral: O Legado de Jogos Mortais, um filme que foge do tradicional e consegue entregar algo fresco, relevante e instigante, mesmo para os padrões já saturados do gênero.
O longa, estrelado por Chris Rock, que também colaborou no roteiro, acerta ao propor uma abordagem mais voltada ao suspense psicológico do que ao terror gráfico puro. A essência das armadilhas macabras ainda está presente, mas a narrativa se aprofunda ao explorar falhas do sistema policial e questões sociais, ampliando o escopo do que se espera de um filme desse universo.
Chris Rock surpreende ao se afastar do humor escrachado que o consagrou e assume com firmeza o papel do detetive Ezekiel “Zeke” Banks. Sua atuação é envolvente, equilibrada e carismática. Mesmo quando insere algumas piadas pontuais, o tom se mantém sério e adequado ao clima sombrio da trama. A construção do personagem é sólida e ajuda a manter o público conectado com a história.
O roteiro, assinado por Josh Stolberg e Peter Goldfinger, é direto ao ponto, com uma estrutura bem definida que evita enrolações. A narrativa gira em torno dos dilemas pessoais e profissionais do protagonista, com motivações claras e objetivos bem estabelecidos, tanto para o herói quanto para o vilão. Embora isso torne mais fácil antecipar alguns desdobramentos, o resultado é um filme ágil, coerente e com ritmo fluido.
Outro ponto alto da produção é a presença sempre marcante de Samuel L. Jackson, que interpreta Marcus Banks, o pai do personagem principal. Mesmo com poucas cenas, Jackson domina a tela e dá profundidade emocional à relação familiar retratada, funcionando como um apoio forte para a jornada de Rock.
Max Minghella também se destaca como o detetive William Schenk, parceiro de Zeke. A química entre os dois personagens remete aos clássicos filmes de dupla policial, com um início conturbado que evolui para uma parceria convincente. Minghella se mostra uma revelação, trazendo equilíbrio ao contraste de personalidades e ganhando espaço ao longo da história.
Com um orçamento mais robusto, estimado em cerca de 20 milhões de dólares, Espiral consegue elevar o padrão de qualidade da franquia. As cenas são visualmente mais refinadas, com uma direção segura de Darren Lynn Bousman e uma fotografia marcante de Jordan Oram. A estética é mais cinematográfica, e a tensão é construída com mais inteligência, tornando as armadilhas um elemento complementar e não o único atrativo da obra.
Espiral: O Legado de Jogos Mortais não apenas resgata a franquia do limbo criativo, como a reinventa com ousadia e relevância. Ao misturar crítica social, suspense bem dosado e atuações sólidas, o filme se estabelece como o melhor capítulo da série até o momento — e mostra que, quando há vontade de inovar, até mesmo sagas desgastadas podem renascer de forma surpreendente.